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quarta-feira, 17 de fevereiro de 2010

VOLTA ÀS AULAS

Todos amontoavam na porta para verificar suas salas, garotas e garotos barulhentos, sorridentes, solícitos e atentos. Eram sete horas de uma manhã cinzenta; fazia muito frio, mas quem se importava. Eu, taciturno, esperava o fim da aglomeração para conferir a minha turma e observava calmamente na esperança de rever RC, pois estavam todos se revendo, se cumprimentando e colocando em dia todos os acontecimentos reais e imaginários.
Os ricos contavam suas férias em locais distantes e realçavam as maravilhas que passaram, falavam de garotas belas e mostravam como troféu de viagem os novos catecismos que adquiriram na capital, que logo os fizeram mais populares ainda entre os garotos. As garotas com seus risinhos histéricos falavam de garotos, de roupas e da novidade daquela idade: namorar. Eu, em um canto, não falava com ninguém. Esperei a algazarra terminar e confirmei, estava na turma g, e RC também. Estava nas nuvens! Verifiquei o meu número, coloquei um caderno velho que eu tinha em cima da minha carteira e fui em busca da minha turma. Nós éramos o lixo, a escória do Colégio Estadual Alberto Torres e agora estávamos todos separados. A minha turma especial que foi separada pela direção do colégio, se reunia antes e depois da aula e era heterogênea: tinha pobre, classe média e um rico, sendo que eu, Jorge e Onça éramos os pobres, Inha, Val e Jalé eram classe média e João era o rico. Éramos amigos, batíamos babas juntos, esculhambávamos, bebíamos vinho, fumávamos cigarros sem filtro e depois cada um ia para sua casa. João morava em uma casa grande e com um campo de futebol ao lado, e sempre nos fins de semana era lá que o nosso baba era jogado.
Naquela manhã de março, os encontrei eufóricos com o novo catecismo do João e foi uma festa; eu era o poeta da turma, e João tinha um catecismo que além de novo era diferente, e não era somente mulher nua, havia sexo de verdade, que foi logo passado para mim.
- Veja que mulher!
- Eu quero emprestado!
- De jeito nenhum, só daqui a uma semana. - todos falavam e olhavam para aquelas belas mulheres transando... aquele tinha a transa... era demais!
-Olha a cara de R.. Vai babar R., não pode comer o catecismo!- foi tanta agonia que João, o mais forte e mais alto e dono do catecismo, tomou de um pulo e disse:
- Chega! Hoje estou indo pra casa mais cedo, vou viajar com meu pai pra Itabuna e volto à noite. Amanhã vocês poderão dar mais uma olhada.
O João foi embora e nós fomos direto pro banheiro.
Um tempo depois, cada um foi pra sua sala e aí a minha alegria aumentou, porque eu esperava encontrar RC, a sua carteira era logo a frente da minha. No banheiro, foi ela que eu imaginei e quando olhei o catecismo era o seu rosto que eu via. RC era uma garota de 13 anos, magra, loura e bem queimada de sol, ela sempre viajava para salvador ou ia pra ilha, ela era rica e seu irmão João era meu amigo, ele sabia que eu era apaixonado por ela e sempre me dizia:
- R, RC lhe acha um tremendo babaca, acha a sua poesia horrível, e ela tem um namorado que é de Conceição de Almeida.
- João, eu ainda vou me casar com sua irmã. Você não perde por esperar.
E então João dava uma risada e me abraçava e me passava um garrafão barato de vinho.
O ano de 1972 começava bem, a única pessoa da minha antiga turma a ficar junto comigo era a minha garota, eu sabia que ela não concordava com isso, mas logo, logo ela me aceitaria. Abri o meu caderno de poesia e arrisquei:

“ Um gosto de RC invade a minha boca,
e o seu beijo é beijo da noite
e o seu corpo é convite
e o seu olhar me implora estrelas,
e suas mãos são frutos macios.”

Nada mais saía, e eu dei por encerrada a poesia e me achei um gênio e amado. Aos 13 anos aquela era a terceira garota que eu me apaixonava, mais RC parecia ser a definitiva.
Fui pra casa, meu primeiro dia de aula fora excelente mesmo sem ter visto RC. Uma amiga dela me informara que ela só chegaria três dias mais tarde, estava em salvador, eu estava nas nuvens. Passei em um bar e sozinho tomei meio litro de um vinho barato, e de volta à rua eu não ouvia as pessoas e andava dançando e cantando e ao chegar em casa tomei um sopapo de minha mãe que berrou:
- Tá maluco!? Bebeu de novo?! Quando seu pai chegar ele te acerta. Meu Deus, você quer me matar!
Aquilo agora era menor, eu tomaria duas dúzias de bolo do meu pai, mas RC era da minha turma.
Comi feijão e arroz com farinha e carne como um sonhador, e feliz saí para os babas e roubos de jaca e outras frutas com os amigos da minha querida baixinha da vitória, a vida continuava sorrindo para mim.


Autor: Ronaldo Braga
Blog Bragas e Poesias,
17 de Fevereiro de 2010

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